segunda-feira, 26 de maio de 2008

Despedida de um Herói!


Hoje escreverei sobre um momento ao qual todos presenciamos na data histórica de 25 de maio de 2008. A despedida de um dos maiores atletas brasileiros de todos os tempos. Falo de Gustavo Kuerten. O maior tenista que o Brasil já teve, e um dos 20 melhores de todos os tempos. Se não fosse pelas graves lesões, seria, tranqüilamente, um dos dez melhores.

Não irei falar sobre a pessoa Guga (pois não há muito mais o que falar, além de comentar o que todos nós já sabemos: ele é um exemplo a ser seguido por todos, não pela suas conquistas, mas devido ao seu caráter, seu modo de pensar e, principalmente, modo de agir!), mas irei comentar sobre como o nosso amado país o trata e, levantar uma teoria caso ele nascesse em um país vizinho, na Argentina.

Primeiramente, se nos focarmos no início de sua carreira, nós (brasileiros) nem o conhecíamos. Nem os profissionais da área (treinadores de tênis), acredito, que também mal o conheciam. O jogador de futebol é diferente... Aos 10 já é famoso, 16 assina contrato com um clube e, aos 17 vai para a Europa. Tudo bem! A situação de hoje é assim. A de 10 anos atrás era diferente... Acrescente um ano em cada fase citada anteriormente. Mesmo no futebol ainda há jogadores que passam despercebidos em inúmeros clubes.
Voltando ao tênis, Guga surgiu em 1997, aos 20 anos de idade, ao conquistar o título de Roland Garros (em sua primeira participação em torneios de "Grand Slam"), vencendo os melhores da época e na final, derrotando o espanhol Sergi Bruguera (que era bi-campeão desse torneio). Após essa conquista, Guga virou mania nacional. Veio o bi-campeonato em 2000, onde também, no qual foi sua melhor temporada, ele foi campeão da "Masters Cup", tornando-se o único tenista a derrotar, em dias seguidos, Pete Sampras e Andre Agassi (considerada sua melhor atuação na carreira). Além disso, consagrou-se como primeiro tenista brasileiro a ocupar o primeiro lugar no ranking da ATP.
Veio o tri de Roland Garros em 2001, que consagrou-o como lenda na França.







Mas como em qualquer outro atleta de elite, seu organismo vivia em uma linha tênue entre o ápice do rendimento e a lesão. O tênis, assim como diversos esportes, é uma atividade muito repetitiva. Imagine ficar durante mais de 3 horas rebatendo uma bola com a maior força possível, quase que ininterruptamente, além de treinos extremamente longos - digo ainda que alguns, como treinos de saque e técnica, são desnecessariamente longos. Qualquer desequilíbrio que você possua em seu corpo, provavelmente ele será agravado, até se tornar uma lesão crônica. Foi o caso de Guga.

Porém, a lesão faz parte do esporte - É NATURAL. Embora muitos colegas da área não pensem assim. Preferindo assim, evitar ultrapassar limites com MEDO da lesão. Há uma linha de pensamento muito forte na área de treinamento com pesos que pensa assim. Uma linha que está dominando até o cenário do esporte de alto rendimento (por incrível que pareça há atletas que treinam sempre com um treinador ao redor sempre preocupado em lesão!).

A palavra da moda: "overtraining" ou "supertreinamento". Que nada mais é do que treinar demais, sem repouso adequado e sem alimentação adequada. Mas o problema é que "overtraining" não pode ser visto como um bicho de sete cabeças. Todo o atleta (amador ou profissional) que treina sério já passou por situações de "overtraining". O que diferencia de um que não se lesiona para o que se lesiona é a capacidade de auto-percepção, de conhecer a si mesmo. Se o atleta possui uma noção de seu corpo, quando chegar ao extremo de sua condição física, ele mesmo sentirá que estará no limite. Nosso corpo envia sinais (abaixa a imunidade, aparecendo gripes, dores de cabeça, cansaço em demasia, falta de concentração, ansiedade, sono, etc.), aos quais, cabe ao atleta e aos treinadores serem capazes de diagnosticá-los. Os treinadores e preparadores físicos, ao perceberem ou serem comunicados que seu atleta se encontra em estado de "overtraining", se os mesmos possuirem o mínimo de humildade, deverão aceitar o fato que tenham, talvez, exagerado em seus planejamentos, e, então, realizarem as devidas modificações.
A lesão de Guga ainda não foi explicada. Sobre esse tema, irei optar pelo silêncio para evitar complicações e más interpretações. Mas que algo como a má iniciação ao desporto (falta de vivência em outras modalidades, por exemplo) e um fraco reforço muscular (poh! Guga come banana até hoje, enquanto outros atletas utilizam algumas substâncias que nem na lista do doping devem aparecer)... Isso é certo! - talvez seja uma "Teoria da Conspiração" adaptada por "Dall'Aqua", mas que acredito fielmente. Isso sim!... Bom... Resumidamente, a lesão de Guga apareceu e seu rendimento caiu. Essa lesão o incomodou durante o restante de sua carreira.
Mesmo assim, em 2004, Guga derrotou (em Roland Garros) o então melhor tenista da época (e até hoje o é) Roger Federer por 3 sets a 0. Ultima partida que Federer perdeu por 3 a 0 até hoje. Apesar disso, a mídia nacional chegou a criticar Guga. Alguns comentaristas esportivos chegaram até denominar suas atuações de "vergonhosas" ou "apáticas". Pegaram no pé de Guga durante um tempo da mesma forma que pegam no pé de Romário, Ronaldo, Ronaldinho. Mas cá entre nós, comparar Guga com qualquer um desses é muita estupidez. Guga é de outra nação. De outro continente. Outro Mundo! Guga é aquela pessoa que se não fosse famosa, seria igual ao que é hoje. É um herói. E assim como nossos Heróis (não aqueles heróis que Pedro Bial "consagra" nos Big Brother's) Guga será esquecido pelo povo ou não tão lembrado como deveria (espero que esteja errado).




Assisti no canal Sportv, nesse fim de semana, a um programa sobre atletismo, onde apareceu uma ex-atleta da modalidade salto em altura, Aida dos Santos Menezes que, para as Olimpíadas de Tóquio 1964, no Japão, teve que saltar 5 vezes o índice olímpico, pois o COB (Comitê Olímpico Brasileiro) não queria levar uma atleta, e muito menos uma atleta negra para Tóquio. Na vila Olímpica ela foi isolada. Sem treinador e sem sapatilhas para treinar e competir, ela treinou por si mesma, e conseguiu, antes da competição, um par de sapatilhas emprestadas de um atleta cubano. Mesmo com uma lesão no tornozelo (pois sem treinador as chances são maiores de lesão), Aida dos Santos conquistou o quarto lugar. Ela até hoje participa de competições masters, e mesmo sendo de origem humilde, se formou em educação física, geografia e pedagogia. Heroína brasileira. Muito pouco ou nada lembrada em nosso país.





Aida dos Santos - Heroína brasileira nos Jogos Olímpicos de Pequim, 1964.

Poderia contar a história de inúmeros outros atletas nossos que fizeram tanto pelo esporte, porém hoje ninguém os lembra. É só irmos ao Museu do Esporte aqui em Porto Alegre para observarmos. Apenas fotos de jogadores de futebol, árbitros e em menor escala, jogadores de vôlei e basquete e por fim, alguns ginastas da moda e tal. Esporte? Será que essa palavra, para o brasileiro é sinônima de futebol? Quantos comentaristas esportivos que só falam sobre futebol nós temos na televisão? E mesmo assim, será que os ídolos do passado são lembrados como deveriam? Olha o Pelé. Admirados por todos lá fora. Aqui, tem alguns ainda que se dão ao trabalho de prestarem atenção nas bobagens que Maradona fala e apresentam programas inteiros com um debate: Será Maradona melhor que Pelé? Fala sério.

Mas é um exemplo marcante de como nós desvalorizamos o que é nosso. Maradona, não servindo nem para limpar chuteiras do Pelé, na Argentina é idolatrado até hoje. Mesmo nunca sendo um atleta exemplar e ex-usuário de drogas. Caso alguém argumentar que é devido a Copa do Mundo. Bom, Pelé tem 3. Outros títulos, não há nem comparação. Capacidade atlética? Maradona, mesmo com todas as substâncias dopantes no planeta não chegaria à capacidade que Pelé tinha. Assistam ao filme do Pelé (não ao que o Chaves insiste em assistir). Corria muito, era forte, saltava igual a um levantador de peso (com muita potência - olhem a foto abaixo de Pyrros Dimas e vejam o quanto ele pulava em suas comemorações), tinha agilidade, flexibilidade, etc. Um atleta, para os padrões da época, perfeito. Hoje, talvez, Mariusz Pudzianowski seja esse atleta.

Pyrros Dimas - Tri-campeão olímpico de Levantamento de Peso e um dos melhores levantadores de peso de todos os tempos. De acordo com Stone e Kirksey in Garrett Jr. e Kirkendall (2003), os levantadores de peso chegam a saltar verticalmente com as pernas estendidas (um dos testes padrões para a avaliação de potência dos membros inferiores), em média, 75.4 cm, superando nesse estudo, atletas do basquete, futebol americano, velocistas, saltadores, etc.




Mariusz Pudzianowski - 4 vezes o campeão do "The World Strongest Man" - corre, possui flexibilidade, coordenação, potência, velocidade, agilidade e, além de tudo, pesa mais de 130 kg em 1.86m de altura.



Retornando novamente ao tema principal, Guga. Será que se ele fosse argentino ele seria mais valorizado. Certamente. Até o tênis seria mais desenvolvido após sua consagração. No Brasil ficou na promessa. Continua tudo como era antes de Guga. Alguns poucos e bastante teimosos treinadores ainda comandam nosso tênis. Raras as oportunidades em que observamos profissionais capacitados como o Ms. Charles Lopes fornecendo prescrição e montagem de treino para alguns tenistas mais conscientes. Não há planejamento em relação à formação e seleção de talentos. Mas se nem no futebol há isso! Como poderia exigir que houvesse no tênis?! Erro da minha parte. Desculpem-me.
Como posso afirmar que na Argentina seria diferente? Olhem o basquete. Houve planejamento. Surgiu uma equipe campeã olímpica. Continuou esse planejamento, mesmo após algumas derrotas. Não precisa mudar por causa de uma derrota. Assim como a lesão, a derrota também é NATURAL! (Lembram das variáveis do rendimento? São muitas...). Provavelmente, após a era Ginobili, haverão outros. Após a era Messi, surgirão outros. Após a era de Contempomi e Corleto (jogadores de rugby) surgirão outros. Por que? Porque nesse país vizinho há PLANEJAMENTO. Planejamento foi o que fez o internacional ser um time forte. Não digo ser campeão da Libertadores, pois aí, de acordo com Dall'Aqua em sua "Teoria da Conspiração", algo maior está por trás disso. Nem comento sobre o Mundial.


Felipe Contempomi - Um dos destaques da Argentina no Mundial de Rugby em 2007.














Manu Ginóbili - Jogador do San Antonio Spurs e líder da Argentina na conquista da Medalha de Ouro nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004.


Finalizando, Guga não recebeu ainda nem um décimo das homenagens que deveria receber de nós (brasileiros). Espero que sejamos capazes de imortalizá-lo em nossa história, pois o que ele conquistou e, principalmente, como ele conquistou são ensinamentos que podemos e devemos transmitir aos nossos descendentes.





Para mais informações, dúvidas ou sugestões, comentem ou enviem um e-mail para rdallsantos@hotmail.com.

Obrigado!

Rodrigo Dall'Aqua