quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Treinamento com pesos e o cérebro humano


O mundo, assim como nós, está em constante mudança. Fazer predições sobre o que acontecerá com você ao realizar alguma tarefa (e corrigir essas predições baseando-se no que está atualmente acontecendo) é assim, de importância vital. Uma teoria bem influente defende que o cérebro resolve esse desafio através do uso dos seguintes modelos: quando você segura um objeto, a antecipada aplicação da força sensorial de sua ação é comparada a real que você aplica. Se há um erro, ou seja, se você pensou que o objeto fosse mais pesado, um sinal de correção é mandado de volta para o córtex motor para rapidamente adaptar o comando à nova carga (carga real).
Apesar disso, existem diversas evidências psico-físicas para os seguintes modelos (para revisão, veja Wolpert e Ghahramani, 2000), e o conceito pode ser ampliado para se explicar até mais algumas formas de comportamento psiquiátrico (Frith et al., 2000), mas a arquitetura neural responsável para essas computações ainda não está completamente compreendida. Jenmalm et al. (2006) vêm contribuindo significativamente para esse tema usando ressonância magnética funcional por imagem em um estudo recentemente publicado no “Journal of Neuroscience”.

Nesse estudo, os autores instruíram os participantes a levantar um objeto com sua mão direita e utilizando as pontas de seus dedos e polegares. Em algumas sessões, o peso do objeto mudou de modo imprevisível: um objeto pesado se tornava mais leve e um objeto leve ficava mais pesado.
Estas alterações foram efetuadas através da adição ou remoção de um peso extra, fora dos “scanners”, que estavam ligados ao objeto que tinha que ser levantado. Durante o experimento, os sinais de força e de posição, bem como a aquisição de todos os tempos foram registradas simultaneamente.

Este sofisticado protocolo de experimento permitiu aos autores comparar o desempenho comportamental e atividade cerebral relacionado com o resultado da imagem feita pela ressonância magnética durante as tentativas de levantamento em que a carga fora modificada e quando o peso não foi alterado.

De um ponto de vista teórico, quando o peso muda inesperadamente, o predito “feedback” sensorial e os reais “feedback” sensoriais não correspondem. Portanto, o módulo comparando os preditos “feedback” sensorial e real vai gerar um sinal de erro.


As mudanças de peso levam a um aumento da atividade no córtex parietal inferior direito (Jenmalm et al., 2006). Um estudo anterior mostra que a ruptura da região parietal posterior do córtex por meio de estimulação magnética trans-craniana interfere com a capacidade de corrigir rapidamente um movimento na base de novas informações sensoriais (Desmurget et al., 1999).

Houve, também, diferenças na atividade cerebral que eram específicas para a questão da modificação da carga. O sensório principal do córtex motor esquerdo tornou-se mais ativo quando o peso foi aumentado, e menos ativo quando o peso foi diminuído (Jenmalm et al., 2006). O cerebelo direito tinha um papel oposto inibitório: ele tornou-se mais ativo quando o peso foi diminuído e menos ativo quando o peso foi aumentado (Jenmalm et al., 2006). Estas atividades provavelmente refletem a real força de correções da mão direita que tinham que ser realizadas e suas conseqüências sensoriais.

Isto é consistente com os papéis excitatórios e inibitórios dos sensores primários do córtex e cerebelo, respectivamente, no controle de movimentos.



Ou seja, em qualquer situação do treino, a coordenação sensorial (adaptação neural) sempre é trabalhada. Porém, muitos treinadores esquecem esse componente do treinamento. Lembram apenas das valências físicas e do sistema metabólico. As variáveis do treinamento para eles consistem em: força, velocidade, resistência e suas subdivisões; e aeróbio, anaeróbio lático e anaeróbio alático.

Mas ao observarmos que, para uma situação (aumento da carga) como para outra inversa (diminuição da carga), há uma adaptação neural que, por sua vez, leva a uma adaptação metabólica e morfológica.

O treinamento, seja qual for, nada mais é do que estímulos que levam a adaptações neurais, metabólicas e morfológicas. Por isso, a técnica dos exercícios deve ser muito bem trabalhada.



Não observamos, nas ditas “academias”, um trabalho de técnica dos exercícios. Você pode até argumentar que um exercício de supino ou uma rosca direta são exercícios de aprendizagem moderada a fácil e, por isso, não é necessário esse tipo de trabalho por um longo tempo. Mas pense bem. Um atleta campeão olímpico de levantamento de peso, mesmo nos quatro anos posteriores a sua conquista da medalha de ouro, treina técnica em torno de 20 a 40% do volume total de treino (Roman, 1986). Será que nós, meros mortais, não devemos também treinar dando ênfase na coordenação intra e intermuscular? Não devemos direcionar nosso treinamento, em certos momentos do ano, para uma adaptação neural?

Infelizmente, para 90% dos praticantes de treinamento com pesos no Brasil preocupam-se apenas em trabalhar, principalmente, a parte estética. O mais importante, o rendimento, fica em segundo ou em terceiro plano.

Na tentativa de mudar esse conceito, postarei futuramente alguns artigos sobre dismorfia muscular (anorexia e vigorexia), distúrbios psicológicos em relação à composição corporal (estética).

Qualquer dúvida ou sugestão, postem comentários ou enviem por e-mail para rdallsantos@hotmail.com.
Obrigado!
Rodrigo Dall’Aqua