sábado, 14 de junho de 2008

IV Simpósio de Educação Física em Cardiologia - Gramado/2008



Hoje, devido à falta de tempo para postar artigos sobre os temas antes desenvolvidos nesse blog, irei comentar sobre o IV Simpósio de Educação Física em Cardiologia realizado em Gramado, na sexta-feira e no sábado (13 e 14, respectivamente), onde tive a oportunidade de, juntamente com os colegas e amigos Luciano Ribeiro e André Rosa, apresentar, em forma de pôster, nosso trabalho sobre EAA (esteróides anabólico-androgênicos).


Rodrigo Dall'Aqua, André Rosa e Luciano Ribeiro - Apresentação do pôster:
Respostas cardiovasculares em usuários de esteróides androgênicos anabolizantes (EAA) submetidos ao teste de esforço máximo.


Não comentarei especificamente sobre o trabalho pois há ainda alguns ajustes a serem realizados. Restringirei-me apenas a citar que, infelizmente, em nossa sociedade são poucas as pessoas que são capazes de discutir, de uma maneira imparcial, sobre algo tão polêmico e (mais importante) algo que está se tornando um problema de saúde pública semelhante à obesidade: o uso abusivo de Esteróides Anabólico-Androgênicos por atletas e não-atletas.

Talvez devido ao medo, ou ao preconceito - um conceito ou opinião sobre algo antes mesmo de ter contato ou conhecimento - muitos colegas com doutorado e até mesmo médicos criticam e menosprezam de tal modo que, se não possuíssemos a vivência e experiência no meio do esporte (a prática!), onde podemos observar um índice elevado e crescente de usuários informados - porém vejam que informação não é sinônimo de CONHECIMENTO! A informação está extremamente fácil de se obter hoje em dia (internet, revistas, jornais, televisão...), já o conhecimento e, principalmente o conhecimento sobre essas drogas, ainda é inexistente na grande maioria da população e também nos próprios usuários - certamente seríamos rigorosamente contra o uso de tais substâncias. Porém, nossa (do grupo) opinião em relação ao tema não é tão extrema assim. É um pouco simples até. Pode ser resumida em uma palavra: "depende". Depende dos objetivos, da dosagem, do "conhecimento" do usuário em relação à substância utilizada, etc. Como tudo na vida, o uso de EAA também possui seus prós e contras. Resultados benéficos e efeitos colaterais maléficos.

Resumindo, acredito que, apesar de toda a informação que podemos encontrar nos meios de comunicação sobre os EAA, ainda não estamos preparados para buscarmos o conhecimento dos EAA. Isso só será possível quando essa barreira do preconceito e do medo for superada. Quando esse tema parar de ser visto por alguns como "piada", onde eles ainda acreditam que quem utiliza tais substâncias são apenas os "ogros" das cavernas, os halterofilistas e fisiculturistas, e, assim como nossos políticos, vivem em outra realidade e raramente (às vezes nunca), retornam ou visitam nosso mundo. Mundo onde os atletas de elite (sim! esses das Olimpíadas - alguns, ou seria a grande maioria?...volto na "Teoria da Conspiração" adaptada por Dall'Aqua), pessoas treinadas (semi-atletas - com longo tempo de treinamento - acima de 6 anos), e até mesmo novatos (acreditem! há usuários com apenas poucos meses de treinamento!) estão usando os EAA com o objetivo de melhora de rendimento e/ou melhora estética (pessoas famosas utilizam também! Vejam a Playboy desse mês! - no mínimo um "Deca-durabolin" (Nandrolona) tem naquele corpinho!).

Mudando de assunto - pois retornarei ao mesmo futuramente, quando nosso trabalho estiver finalizado - gostaria de comentar sobre os pontos mais marcantes desse encontro. Primeiramente, como de costume, irei polemizar, e falarei sobre uma propaganda do MEC que foi muito criticada pelos profissionais da Educação Física: nesse comercial - do "Pro-uni" - há dois jovens na praia. A menina diz que quando olha para o mar, sonha em ser bióloga. Já o menino, olha para a praia e observa umas mulheres jogando vôlei, e diz que sonha em fazer Educação Física, sendo que logo após, a garota pergunta com cara de deboche: "Educação Física??", ficando clara a opinião da maior parte da população brasileira em relação ao educador físico: um folgado, sem estudo, que gosta de esportes, resumindo, um professor que apenas joga a bola para as crianças se divertirem.

Peço a todo profissional (Educador Físico) que esteja lendo essa coluna que entre no site do MEC (http://portal.mec.gov.br/) e faça uma crítica à propaganda. Como Educadores Físicos devemos exigir RESPEITO. Vagabundo existe em todas as profissões! Não podemos ficar manchados por alguns elementos.

Nossa área tem que começar a ocupar seu devido e merecido espaço na sociedade. Através de profissionais bem capacitados, podemos fazer parte de uma equipe multi-disciplinar para auxiliar na reabilitação de pacientes cardiopatas, diabéticos e etc. Podemos realizar inúmeras pesquisas científicas sobre o CORPO HUMANO (ainda pouco conhecido pelo homem). Podemos treinar campeões olímpicos. Somos os mais aptos para isso! Mas estamos perdendo espaço. Espaço que ainda não está ocupado, porém, aos poucos, devido à nossa incompetência, está sendo preenchido por profissionais de outras áreas (até mesmo não ligadas à Área da Saúde!).



Assim, fica um sinal de alarme para todos os colegas. Devemos exigir mais respeito, porém, ao mesmo tempo, devemos fazer por merecê-lo. O principal meio é o estudo, o conhecimento. E, através dele, devemos, pouco a pouco, transformar (modificar) a cultura brasileira que se instalou desde a época da ditadura, onde a Educação Física era mecanicista e repetitiva - e continua sendo até hoje (infelizmente) - para então, instalar uma "cultura da Saúde", onde o Ministério da Saúde seja realmente o da "saúde" e não o da "doença" como é atualmente, onde ele prioriza o tratamento ao invés da PREVENÇÃO! Sendo comprovado que a cada 1 real gasto na "Saúde" (esporte, exercícios físicos, lazer...) o governo economiza mais de 3 reais no tratamento de futuras doenças!
Dúvidas ou informações: postem comentários ou enviem um e-mail para rdallsantos@hotmail.com.
Obrigado!
Rodrigo Dall'Aqua

domingo, 8 de junho de 2008

Levantamento de peso - capacidades motoras (parte II)

Nesse artigo, retornaremos à modalidade de levantamento de peso, onde continuaremos a descrevê-la de um modo científico, agora as capacidades especiais da força, ou seja, os tipos de força que a modalidade mais necessita: força rápida e força máxima. Primeiramente, conceituaremos o significado de "força" de acordo com a literatura, para então, entrarmos nas divisões e por fim, definirmos meios e métodos de treinamento que são utilizados para se treinar cada tipo de força.

Força - A força muscular é importante em vários esportes, especialmente no Levantamento de peso, onde é a capacidade física mais solicitada.

A força está ligada a capacidade de aplicar impulso. Representa a capacidade do indivíduo para vencer ou suportar uma resistência, ou seja, é a capacidade de superar resistências e contra-resistências por meio da ação muscular (Bompa, 2002; Verkhoshanski, 2001). Também pode ser definida como a capacidade neuromuscular de superar uma resistência externa e interna (Zakharov, 2003). Em nível microscópico, a força pode ser definida como o número de pontes cruzadas de miosina que podem interagir com os filamentos de actina (PANCORBO SANDOVAL, 2005).


Harman (1993) cita que a mais precisa definição de força muscular é a capacidade de exercer força sob determinadas de condições como a posição do corpo, o movimento do corpo ao qual a força é aplicada, o tipo de movimento (concêntrico, excêntrico, isométrico, pliométrico) e a velocidade do movimento (BARBANTI, 1997; MAUGHAN e GLEESON, 2007).


Já o treinamento de força, também conhecido como treinamento contra resistência (treinamento resistido) é uma das formas mais populares de exercício para melhorar a aptidão física de um indivíduo e para o condicionamento de atletas (Fleck, 2006) e, de acordo com Weineck (2003, p. 224): “Antes de se fazer uma classificação dos tipos de força, deve-se considerar que a força e suas diversas manifestações podem ser sempre consideradas sob os aspectos de força geral e força específica”, sendo que os exercícios utilizados para o trabalho da força geral agem sobre todos os grupos musculares, independente dos movimentos que determinada modalidade esportiva exige, visando o desenvolvimento harmonioso de todo o organismo com o aperfeiçoamento de suas estruturas e funções, servindo de base para suportar as cargas de treinamento de caráter especial do esporte considerado (BARBANTI, 2001).

Em relação à força específica, de acordo com Kraemer e Häkkinen (2004) a especificidade do treinamento de força é fundamental para o resultado final no desporto, o qual determina algumas exigências para determinados tipos de força, ou seja, enquanto algumas modalidades requerem um alto nível de força máxima e de força-velocidade, outras exigem níveis altos somente de força resistente ou de força-velocidade. Ainda há também outras modalidades que necessitam de um equilíbrio desses tipos de força (PLATONOV, 2004).







Agachamento frontal - exercício específico de força no levantamento de peso.







Treino de tackle - ótimo treino para esportes como rúgbi ou futebol americano







Treino com cinta de peso (trenó - wield belts) - Específico treino de força para esportes de corrida como atletismo, futebol, futebol americano, rúgbi, etc.






É importante destacar que no âmbito desportivo, os tipos de força mencionados não se manifestam de forma isolada, mas sim em completa interação determinada conforme a especificidade de cada modalidade esportiva (Platonov e Bulatova, 2003). De acordo com Ritzdorf (2000), o desenvolvimento da força e da potência muscular é parte integrante do treinamento em quase todos os esportes. No entanto, os objetivos do treinamento são tão diferentes quanto os conteúdos, métodos e procedimentos utilizados.

Quanto aos métodos e programas do treinamento de força, encontramos vários exemplos e sugestões na literatura. Baseado em Weineck (2003), listamos alguns deles: Treinamento de Força Dinâmico (Positivo ou Concêntrico e Negativo ou Excêntrico), Treinamento Pliométrico e Treinamento de Força Estático Isométrico. Dentro destes métodos ainda existem outras subdivisões.

Para entendermos melhor, buscamos as classificações da força, onde, segundo Weineck (2003) temos três tipos: resistência de força (onde detalharemos apenas a força de resistência hipertrófica pelo fato de se aproximar mais, mesmo sendo uma capacidade geral, da especificidade do esporte) (Kraemer e Häkkinen, 2004), e a força máxima e força rápida, que serão consideradas capacidades motoras especiais para o levantamento de peso.

Capacidades motoras especiais - Força Máxima e Força Rápida:

Em relação à força máxima, podemos conceituá-la como a maior força disponível que o sistema neuromuscular pode mobilizar através de uma contração máxima voluntária quando a resistência só pode ser deslocada uma vez, ou se desloca ligeiramente e/ou transcorre a uma velocidade muito baixa em uma fase de movimento (WEINECK, 2003; BADILLO e AYESTERÁN, 2001).

No desporto de alto nível, Platonov (2004) cita que são utilizadas duas vias relativamente independentes e muito eficazes para desenvolver a força máxima. A primeira via pressupõe o incremento da força mediante o aperfeiçoamento dos mecanismos neurorreguladores (aprimoramento da impulsão e da coordenação inter e intramuscular) e o aumento da capacidade, da potência e da mobilidade do sistema alático de fornecimento de energia para a contração muscular.

Mas, esse meio não fornece um grande aumento da massa muscular, o que é importante, sobretudo, em modalidades esportivas em que o peso corporal não deve ser demasiadamente aumentado, como por exemplo, as competições de levantamento de pesos, onde os atletas de determinadas categorias de peso corporal devem aumentar sua força sem ultrapassar o peso limite (Weineck, 2003), ocorrendo uma melhora no recrutamento das fibras lentas, do tipo I, e rápidas, do tipo IIa e do tipo IIb, que atualmente são denominadas, de acordo com Pereira (2007), fibras do tipo IIx.

A segunda via, de acordo com Hartmann e Tünnemann apud Platonov (2004), pressupõe o aumento da força mediante o aumento do diâmetro muscular, baseando-se em uma organização do treinamento que permite uma intensa degradação das proteínas dos músculos ativos, estimulando, então, a síntese protéica no período de recuperação com a conseqüente supercompensação das proteínas contráteis e o respectivo aumento da sua massa.

Atualmente, os treinadores russos de levantamento de peso russos aparentam estarem utilizando demasiadamente essa via como método para o aumento da força. Charniga Jr. (2008), ao escrever um artigo sobre o Campeonato Europeu de Levantamento de Peso, 2008 (que pode ser acessado em seu site: http://www.sportivnypress.com/English/frames.html), cita que a maioria dos atletas russos estão treinando demais os membros superiores, como por exemplo os atletas Beretsov e Plovnikov, que aparentam até possuírem maior volume muscular em suas extremidades superiores do que nas extremidades que realmente importam para o esporte e que, sem dúvida nenhuma, são mais essenciais para o aumento da força em âmbito geral.

Plovnikov com seus braços maiores do que o necessário levantando 205 kg no arremesso.






Beretsov se lesiona após aquecimento para a prova de arremesso - observem que há uma desproporção entre membros superiores e tronco em relação às pernas.
















Beretsov realizando com muita dificuldade sua única tentativa de sucesso no arremesso com 220 kg


Porém, independente de qual via for utilizada para se treinar a força máxima, devemos compreender que a ação ocorrerá principalmente a nível neuromuscular, por isso Bompa (2001, p.150) afirma que “(...) um dos principais objetivos do treinamento de força máxima é aprender a eliminar a inibição do SNC”. Assim, uma diminuição dessa inibição, acompanhada por um aumento na força, resultaria no maior aumento do potencial de força, que está relacionada com a força absoluta. Força absoluta é a soma da força máxima e da força de reserva, mobilizada somente sob condições extremas (risco de vida, hipnose, etc.), ou seja, ela refere-se à capacidade de um atleta para exercer força máxima, não importando seu peso corporal (WEINECK, 2003).

A força absoluta, de acordo com Bompa (2001, p.26) “é necessária para se atingir altos níveis em alguns esportes (arremesso de peso, categorias de peso mais pesado no levantamento de pesos e luta greco-romana)”, ou seja, um alto nível de força absoluta é necessário quando o atleta deve superar uma grande resistência externa e quando há uma breve e uniforme contração isométrica juntamente com uma significante carga externa (VERKHOSHANSKY, 1995).

Resumindo, a força máxima, sendo uma capacidade motora que para ser treinada deve sofrer estímulos principalmente neuromusculares, só pode ser treinada através de cargas máximas ou próximas (acima de 90% de 1 AVM - Ação voluntária máxima ou comumente denominada RM - Repetição Máxima) (Bompa, 2002, Weineck, 2003, Platonov, 2008). Alguns autores, como Bompa (2002) ainda citam a Força Supramáxima, ou seja, acima de 100% de 1 AVM. Porém, Badillo e Ayesterán (2001) citam que a força supramáxima (ou a força acima de 100% de 1 AVM) só pode ser realizada de maneira excêntrica ou isométrica, ou seja, caso seja possível levantar a carga ao menos uma vez, essa carga automaticamente se torna o 100% de 1 AVM, mesmo que na sessão anterior, o mesmo 1 AVM fosse 10 kg a menos.



Mariusz Pudzianowski realizando um exercício de competição em situação de força máxima.



Sale (2006) no livro de Komi: Força e Potência no Esporte (2006) cita os principais meios de adaptação (hormese - lembram do artigo "Sistema Endócrino", onde comentei sobre adaptação-hormese?) neural ao treinamento de força. Um deles é o incremento da ativação dos agonistas, onde Seluianov (2008) fornece uma breve explicação de como funciona o mecanismo neural da contração muscular, citando que quando o atleta contrai qualquer músculo, ativa os correspondentes motoneurônios no córtex cerebral, que por sua vez envia impulsos para a medula espinal, através dos feixes de motoneurônios, servindo dado músculo. Visto que nos feixes de motoneurônios o tamanho deles é diferenciado, então, diante de um impulso de baixa freqüência a partir do sistema nervoso central, só consegue-se ativar motoneurônios de baixo limiar. Cada neurônio inerva as suas fibras musculares, por isso a ativação do motoneurônio leva ao recrutamento ou excitação das correspondentes fibras musculares (tipo I, IIa e IIx, além de outros tipos).

A ativação dos músculos sinergistas (músculos que contribuem para o movimento, porém não consideraremos os agonistas) também é, de acordo com Sale (2006), uma hormese ou um ajustamento neural devido ao treinamento. Assim com uma menor co-ativação dos músculos antagonistas, o que, de acordo com Aagaard et al. (2000) apud Komi (2006), essa co-ativação parece ser contraprodutiva, particularmente em uma tarefa de força. Mas uma das principais alterações hormértica em relação às respostas neurais ao treinamento de força, pode-se dizer que seja uma maior sincronização das unidades motoras (UMs), mesmo apesar de existirem poucos estudos longitudinais ou transversais de treinamento comparando grupos treinados e não-treinados (Sale, 2006), pode-se observar que a força de uma contração máxima depende de quantas unidades motoras são ativadas simultaneamente, assim como (ou até mais) da área de secção transversal do músculo envolvido (MAUGHAN e GLEESON, 2007).



Exemplo de músculos agonistas e antagonistas.


Analisando essas modificações, onde percebemos que durante o exercício máximo, o recrutamento inicial completo de (quase) todas as UMs é seguido por uma perda gradual de algumas UMs quando a fadiga acontecer (Maughan e Gleeson, 2007), podemos dizer que o tempo de recuperação para uma nova série deve ser suficiente para a restauração (quase) completa dessas UMs e do estoque de ATP para poder gerar um no recrutamento de UMs que seja tão intenso (ou quase) ao anterior, ou seja, para séries de força máxima, onde são recomendadas de 1 a 3 repetições, são necessários intervalos acima de 5 minutos (OLESHKO, 2008, EL-HEWIE, 2003; BADILLO e AYESTERÁN, 2001; WEINECK, 2003; BOMPA, 2002).


Ronnie Coleman descansando após uma série. Mesmo no fisiculturismo, em algum período do ano, é recomendável realizar treinos de força máxima.


Encerraremos essa parte sem comentarmos sobre a capacidade motora de Força Rápida para o texto não ficar muito maçante. No próximo artigo sobre Levantamento de peso retomarei alguns tópicos sobre sistema nervoso e finalizarei as capacidades motoras da força, citando as duas restantes (Força Rápida e Resistência de Força).
Dúvidas ou informações, comentem o blog ou enviem um e-mail para rdallsantos@hotmail.com.
Obrigado!
Rodrigo Dall'Aqua